Semana decisiva para a Educação: Fundeb e Escola Sem Partido em pauta

Articulação de sociedade civil lança publicamente vídeo com mensagem às Ministras
e Ministros do STF sobre julgamento de ações referentes ao Escola Sem Partido e
manifesta solidariedade em caso de menina de dez anos estuprada pelo tio.

A semana que começa tem duas votações importantes para a política de educação
no Brasil. O Senado deve votar em plenário no dia 20 a Proposta de Emenda à Constituição
(PEC) 26/2020
que torna permanente o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da
Educação Básica e Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). Enquanto isso, o
Supremo Tribunal Federal (STF) conclui até sexta-feira, dia 21, o julgamento das Ações
Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) 5537, 5580 e 6038 que questionam a
constitucionalidade da Lei Escola Livre de Alagoas, única lei estadual nos moldes do Escola
Sem Partido
.

Além das ADIs, o STF julga também as Arguições de Descumprimento de
Direito Fundamental (ADPFs) 461, 465 e 600. As três ADPFs se referem a legislações dos
municípios de Paranaguá, Blumenau e Londrina que proíbem o debate sobre gênero e
sexualidade nas escolas e têm como relator o ministro Barroso.

“Mesmo diante de tantos ataques, vemos que o movimento de defesa de uma
educação pública de qualidade está articulado e pode ter conquistas importantes. A
valorização dos profissionais de educação é um elemento central dessas duas frentes de
luta: na garantia de mais recursos para educação pública por meio de um Fundeb com CAQ
e no reconhecimento da inconstitucionalidade de iniciativas que criminalizam e perseguem
professoras e professores”, afirma Denise Carreira, membro da Rede de Ativistas pela
Educação do Fundo Malala e coordenadora institucional da ONG Ação Educativa, entidade
que coordena uma articulação que vem atuando pela liberdade de cátedra nas escolas.

Para que o Supremo Tribunal Federal se posicione pela inconstitucionalidade de
todas as leis inspiradas no movimento Escola Sem Partido, a articulação lança hoje um
vídeo com mensagens de seus integrantes aos Ministros e às Ministras do Tribunal pedindo
para que julguem inconstitucional todas as ações que tratam da matéria

A articulação é constituída pelas seguintes organizações e redes de sociedade civil:
Ação Educativa, Artigo 19, Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas (ABRAFH),
Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos
(ABGLT), Associação Mães pela Diversidade, Associação Nacional de Pós-Graduação e
Pesquisa em Educação (ANPED), Associação Nacional de Política e Administração de
Educação, Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente
(ANCED), Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB), Associação Nacional de Travestis e
Transexuais (ANTRA), Associação Nacional de Juristas pelos Direitos Humanos LGBTI
(ANAJUDH), Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Centro de Defesa da Criança e
do Adolescente do Ceará (CEDECA Ceará), Centro de Estudos Educação e Sociedade (CEDES), Cidade Escola Aprendiz, Comitê da América Latina e do Caribe para a Defesa
dos Direitos das Mulheres (CLADEM Brasil), Centro Feminista de Estudos e Assessoria
(CFEMEA), Cidadania, Estudo, Pesquisa, Informação e Ação (CEPIA), Conectas Direitos
Humanos, Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Confederação
Nacional dos Trabalhadores dos Estabelecimentos em Educação (CONTEE), Conselho
Nacional de Igrejas Cristãs, Frente Nacional Escola Sem Mordaça, Geledés – Instituto da
Mulher Negra, Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual e de Gênero (GADvS),
Instituto Alana, Instituto Brasileiro de Direito da Família (IBDFAM), Instituto Maria da Penha,
Movimento Educação Democrática, Open Society Justice Initiative, Plataforma de Direitos
Humanos – Dhesca Brasil, Projeto Liberdade, Rede Nacional de Religiões Afro-brasileiras e
Saúde (RENAFRO), Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições do Ensino Superior
(ANDES-SN), THEMIS – Assessoria Jurídica e Estudos de Gênero, União Nacional dos
Conselhos Municipais de Educação (UNCME), Associação TAMO JUNTAS – Assessoria
Jurídica Gratuita para Mulheres Vítimas de Violência. Parte dessas entidades foi admitida
como Amicus Curiae (Amigos da Corte) em várias das ações em julgamento no STF.

As entidades também manifestam solidariedade à menina de dez anos estuprada
pelo tio no Espírito Santo e apoio à família, ao juiz, ao promotor e aos profissionais de
saúde que atuaram para garantir o direito da criança ao aborto legal. Grupos
fundamentalistas religiosos vêm perseguindo a família e os profissionais vinculados ao
caso. As entidades destacam que o Supremo Tribunal Federal decidiu por unanimidade em
julgamentos recentes – sobre ações vinculadas ao movimento Escola Sem Partido – que
abordar gênero e sexualidade em escolas é dever do Estado brasileiro como forma de
proteger crianças, adolescentes e mulheres contra a violência sexual, como previsto no
Estatuto da Criança e Adolescente (ECA/1990) e na Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2016).

ESCOLA SEM PARTIDO

O STF iniciou na última sexta-feira (14/8) o julgamento das Ações Diretas de
Inconstitucionalidade (ADIs) que questionam a Lei Escola Livre de Alagoas (ADIs 5537,
5580 e 6038). Sancionada em 2016, a lei está suspensa desde 2017 por decisão liminar do
ministro Roberto Barroso, relator da matéria. A Lei nº 7.800/2016 vedava o que chamou de
“doutrinação ideológica” por parte do corpo docente ou da administração escolar. Devido ao
caráter vago dessa classificação, que poderia levar a perseguições e ataques aos
profissionais da educação, foram abertas três Ações Diretas de Inconstitucionalidade
(ADIs), pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino
(Contee), pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e pelo
Partido Democrático Trabalhista (PDT). As duas últimas foram apensadas à primeira.

“Só pode ensinar a liberdade quem dispõe de liberdade. Só pode provocar o
pensamento crítico, quem pode igualmente proferir um pensamento crítico”, afirma Barroso
no voto que abriu o julgamento na sexta-feira.Para o ministro lei viola o direito à educação, já que este é indissociável do pluralismo de ideias. Segundo ele, a concepção de neutralidade, é “altamente questionável” porque todas as pessoas são produto de suas vivências, ressaltando que a própria lei “parte de preferências políticas e ideológicas”. Ao não definir o que seria a doutrinação, a le serviria justamente “à finalidade inversa: a imposição ideológica e a perseguição dos que dela divergem”.

PRECEDENTES

O julgamento se segue a uma série de decisões em que o Supremo Tribunal Federal
invalidou com unânimidade leis municipais que proibiam a abordagem da temática de
gênero e orientação sexual em escolas. Até o momento, quatro legislações foram
analisadas (ADPF 526, 467, 460, 457) e os ministros foram unânimes em afirmar que
diversos princípios constitucionais, como a liberdade de expressão e o combate às
desigualdades.

Em seu voto na ação sobre a legislação em Cascavel (PR), o ministro Luiz Fux
afirmou que “A proibição genérica de determinado conteúdo, supostamente doutrinador ou
proselitista, desvaloriza o professor, gera perseguições no ambiente escolar, compromete o
pluralismo de ideias, esfria o debate democrático e prestigia perspectivas hegemônicas por
vezes sectárias”.

Esses precedentes – assim como a liminar em que o ministro Barroso suspendeu a
Lei Escola Livre – aumentam as expectativas em relação ao julgamento desta semana. A
decisão do STF tem caráter vinculante, valendo não só para o caso específico, mas
mostrando o posicionamento da corte mais alta do país em relação a todas as leis similares.
Dessa forma, trata-se de um julgamento crucial para a educação brasileira. É por essa
razão que a articulação de organizações e redes de direitos humanos tem atuado junto ao
STF contra a censura nas escolas. As entidades enviaram subsídios e um vídeo à corte
argumentando como a censura prejudica a efetivação do direito à educação, à liberdade
religiosa, direitos das crianças e adolescentes, de mulheres e pessoas LGBT, da população
negra e ataca a democracia de forma geral.

FUNDEB PRA VALER É FUNDEB COM CAQ

Organizações de direitos humanos também têm engrossado mobilizações em torno
da votação no Senado da PEC do Fundeb. A principal demanda é manter o texto aprovado
pela Câmara dos Deputados, considerado por especialistas um avanço para a garantia das
condições de funcionamento de creches e escolas.

Além de tornar o Fundo permanente, a proposta amplia a complementação da União
no financiamento da educação de 10% para 23% e incorpora o Custo Aluno-Qualidade
(CAQ), mecanismo que permite o cálculo dos insumos necessários para o bom
funcionamento de todas as escolas.

A Ação Educativa, em parceria com a Campanha Nacional pelo Direito à Educação
e a Oxfam Brasil, lançou a campanha “Quero um #FundebPraValer”, que tem buscado
mobilizar a sociedade e esclarecer interpretações equivocadas sobre as mudanças defendidas no Fundeb. A petição, que já tem mais de 14 mil assinaturas, ressalta a importância dos avanços conquistados no texto para a superação das desigualdades educacionais no país.

Este post foi publicado em Direitos Humanos, Notícias, Sem categoria e marcado com a tag , em por .

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.