Planos de Educação

O Brasil tem um grande desafio nos próximos anos: fazer com que todos os municípios e estados brasileiros cumpram seus Planos de Educação e possibilitem a melhoria da qualidade da educação em nosso país.

Os Planos de Educação são documentos, com força de lei, que estabelecem metas para que a garantia do direito à educação de qualidade avance em um município, estado ou país, no período de dez anos. Abordam o conjunto do atendimento educacional existente em um território, envolvendo redes municipais, estaduais, federais e as instituições privadas que atuam em diferentes níveis e modalidades da educação: das creches às universidades. Trata-se, pois, do principal instrumento da política pública educacional.

Sendo assim, os Planos de Educação são, também, um importante instrumento contra a descontinuidade das políticas, pois orientam a gestão educacional e referenciam o controle social e a participação cidadã.

Conheça aqui mais da história dos Planos de Educação no país, além de dicas e orientações para o seu monitoramento.

O Plano Nacional de Educação (2014-2024) completa cinco anos de vigência em 2019. Como forma de monitoramento, três balanços de quatro anos de sua implementação foram divulgados. Em todos eles, o cenário é de grave descumprimento.

No balanço realizado pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação em parceria com a Universidade Federal do Paraná, verifica-se apenas um dispositivo cumprido integralmente, mas com atraso: a publicação bianual de estudo de aferição da evolução das metas.

De responsabilidade do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais (INEP), o último estudo (2018), indica o cumprimento da Meta 13, sobre a titulação mínima de docentes do Ensino Superior. A meta estipulava que se garantisse que pelo menos 75% dos professores fossem mestres e 35%, doutores. Para o INEP, o objetivo foi alcançado em 2015. Há, entretanto, fortes diferenças quando se observa o dado discriminado por tipo de instituição: nas organizações privadas, a titulação continua abaixo da esperada.

Há ainda, uma terceira avaliação, de autoria da Associação Nacional de Políticas e Administração da Educação (ANPAE), em que estão disponíveis artigos acadêmicos de análise das metas do Plano.

Mesmo construído com ampla participação social e aprovado pelo poder legislativo, o PNE vem sendo totalmente ignorado pelo Governo Federal, que não tem nem cumprido com – nem sequer falado de – suas metas e estratégias.

O subfinanciamento da área também fere o cumprimeno do Plano. Com a Emenda Constitucional 95 (EC95/2016) em vigência – que congelou os investimentos em educação até 2036 –  a necessidade de ampliar o investimento público em educação de 6% para 10% do Produto Interno Bruto (PIB) em 10 anos fica estagnada. A falta de financiamento – e, com isto, o descumprimento da meta 20 do PNE – tem um efeito cascata sobre as outras metas.

Além disto, o enfraquecimento das instâncias de participação, com o desmonte do Fórum Nacional de Educação e a mudança da coordenação da Conferência Nacional de Educação (CONAE) para o Ministério da Educação prejudica o diálogo entre governo e sociedade civil e enfraquece a mobilização social.

Ainda, a extinção da Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino (SASE), responsável por prestar assistência técnica ao monitoramento e avaliação dos planos de educação e a falta de outro ente federal que cumpra esta função dificulta o acompanhamento do plano nos estados e municípios.

Para que os Planos de Educação estejam sintonizados com os desafios locais, regionais e nacionais, é fundamental que em seu processo de elaboração, revisão e monitoramento seja contemplada a pluralidade de vozes e olhares sobre a educação. Afora a participação dos gestores, dirigentes de ensino e especialistas em educação, é essencial considerar a opinião de toda a comunidade escolar, ou seja, professoras, coordenadoras, merendeiras, secretárias, agentes de apoio da escola, estudantes, pais, mães e responsáveis.

Entende-se que a participação no processo de elaboração, monitoramento e avaliação dos planos permite compor uma visão mais ampliada dos processos, problemas e possibilidades da educação em determinado território, gerando compromissos e responsabilidades com o planejado: compromete os governos com sua execução e a sociedade, de maneira geral, com seu acompanhamento e monitoramento.

A proposta de um Plano de Educação com objetivo de coordenar e fiscalizar a política educacional de médio e longo prazos existe desde a década de 1930, a partir da criação do Conselho Nacional de Educação (1931) e da divulgação do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, em 1932.

No conjunto das atribuições previstas no decreto de criação do Conselho Nacional de Educação, em 1931, havia o que se pode denominar como Plano Nacional de Educação. No caso do Manifesto, elaborado por educadores e intelectuais brasileiros, já se identificava a necessidade da formulação de uma política educacional para todo o país, com um plano para sua execução, que tivesse continuidade ao longo dos anos e fosse além do tempo de uma gestão governamental.

O Manifesto influenciou a elaboração da Constituição de 1934, a qual estabeleceu como uma das competências do governo federal, “fixar o plano nacional de educação, compreensivo do ensino de todos os graus e ramos, comuns e especializados; e coordenar e fiscalizar a sua execução, em todo o território do país”. Em 1937, o Conselho Nacional de Educação apresentou uma proposta de Plano que não foi concluída, em decorrência da suspensão dos trabalhos da Câmara dos Deputados, onde o Plano estava em estudo.

Apenas na década de 1960 foi elaborado um novo esboço de plano pelo Conselho Federal de Educação voltado à aplicação dos recursos federais para a educação, que, no entanto, foi abandonado antes sequer de encaminhado ao Legislativo. Entre 1970 e 1980, durante a ditadura militar, a elaboração dos planos de educação esteve atrelada aos processos mais gerais de planejamento centralizado do governo nacional da ditadura militar, sem contar com a participação de educadores ou profissionais da área da educação.

Foi somente a partir de intensa mobilização popular que em 1988, a Constituição Federal incorporou a obrigação de se estabelecer um plano nacional de educação, de duração plurianual. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de 1996 determinou o prazo de um ano para a União encaminhar ao Congresso Nacional, o Plano Nacional de Educação. No entanto, somente 13 anos depois da promulgação da CF e quatro anos após a LDB, foi aprovado o Plano Nacional de Educação com vigência de 2001 a 2010.

Este Plano foi resultado do embate de dois projetos, que tramitaram simultaneamente no Congresso Nacional: o projeto da sociedade civil, construído nas Conferências Nacionais de Educação e o projeto do governo. Avaliações realizadas ao final de sua vigência evidenciam que o PNE aprovado não se constituiu como base para o planejamento da educação nacional, nem foi utilizado pela sociedade civil e política para reivindicar seus direitos, por não considerarem que este traduzia os anseios e esforços políticos em sua elaboração.

Um dos principais entraves para a transformação do Plano em política de Estado foram as restrições orçamentárias ao Plano, em virtude de vetos presidenciais à ampliação de recursos para o alcance das metas. Apesar das limitações, avalia-se positivamente o fato de que o processo de elaboração do Plano teve um caráter pedagógico, ao evidenciar os interesses e embates existentes na sociedade brasileira sobre a política educacional, além de que possibilitou a criação de novos marcos para a organização e gestão da educação nacional.

Uma importante lição a ser extraída deste curto histórico de construção de planos de Estado para a educação, com muitos percalços, conflitos e embates, é que a participação social em seu processo de elaboração gera compromissos e responsabilidades com o planejado: compromete os governos com sua execução e a sociedade, de maneira geral, com seu acompanhamento e monitoramento.

É importante lembrar também que a implementação das metas previstas no Plano de Educação requer a definição dos recursos necessários. Sem os recursos financeiros necessários, sua execução será muito difícil.

Na história brasileira, já tivemos planos sem os recursos financeiros compatíveis com as metas previstas e o resultado foi a não aplicação do Plano, no tempo e velocidade necessários para responder as demandas sociais.

No atual Plano Nacional de Educação (2014-2024), o subfinanciamento também tem sido um entrave. Apesar da necessidade de um investimento adequado em educação ter sido prevista durante a construção do plano – inclusive com a aprovação de uma meta exclusivamente dedicada ao tópico – ela tem sido ignorada e escanteada pelo governo federal.

A aprovação da Emenda Constitucional 95 no ano de 2016, que restringe os gastos nas áreas sociais por 20 anos, inviabiliza o cumpriemento da meta 20, que prevê a elevação do investimento de 6% para 10% do PIB em educação e tem efeito cascata sobre outras metas.

A EC95 também fere a implementação do Custo Aluno-Qualidade (CAQ), um mecanismo previsto no PNE que define o valor necessário por estudante para se cumprir a legislação educacional e os objetivos e estratégias contempladas no Plano.

Para piorar a situação, no ano de 2019, a Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação realizou uma reunião extraordinária com o Ministério da Educação em que revogou o parecer sobre o CAQ/CAQi, esquivando o MEC da responsabilidade de garantir um financiamento adequado para a área.

Para saber mais sobre Custo Aluno Qualidade, acesse: Educação Pública de Qualidade: quanto custa esse direito?

Em tempos de tantos retrocessos e ameaças ao direito humano à Educação, é necessário somar forças e atuar em conjunto para que os planos de educação tenham condições de serem efetivamente implementados. Por isso, o De Olho nos Planos chama todos e todas a se comprometerem com eles, fazendo parte do monitoramento participativo dos Planos de Educação!

Para ajudar nesse importante processo, a iniciativa De Olho nos Planos produziu materiais que estimulam esse debate e essa prática, com o intuito de garantir que fóruns e conselhos de educação, secretarias, escolas, comunidades, organizações da sociedade civil, movimentos sociais, coletivos e pessoas em geral realizem experiências de gestão democrática e de controle social na educação em seu município ou estado.

Todos os materiais estão disponíveis na página sobre Monitoramento Participativo, acesse!

Sendo instrumentos de planejamento da política educacional, os Planos de Educação devem respeitar a legislação, os demais planos de médio e longo prazos e leis orçamentárias referentes ao nível governamental em que estão vinculados, para que suas metas sejam possíveis e viáveis de serem alcançadas no período previsto. No caso dos municípios, por exemplo, além de respeitar a Constituição Federal (CF) de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de 1996, o Plano Nacional de Educação (PNE), e demais leis nacionais, estaduais e municipais, devem estar vinculados aos planos locais de médio e longo prazos, como o Plano Diretor e o Plano Plurianual (PPA).

Se por um lado os Planos de Educação devem respeitar o previsto na legislação educacional e orçamentária vigente, por outro, suas metas devem incidir no conteúdo das leis e planos futuros, que terão vigência no período de duração do Plano de Educação. Sem esta incidência, os Planos de Educação são apenas cartas de intenção. Sem os mecanismos legais e financeiros disponíveis para a sua viabilização – tais como o Plano Diretor, PPA e LDO – suas metas ficam sujeitas à vontade dos gestores e a quaisquer variações políticas e econômicas. Portanto, para garantir sua execução, não basta somente atuar em prol da inserção de propostas e metas no Plano de Educação, é também preciso acompanhar e incidir nestes demais instrumentos, que tem como objetivo orientar o desenvolvimento urbano e o uso dos recursos públicos. Veja a seguir um pouco mais sobre cada um deles:

Plano Diretor: é um plano de duração decenal, que apresenta os princípios e regras orientadoras para a ocupação do território, ou seja, para o planejamento do desenvolvimento territorial da cidade. Todo município com população acima de 20.000 habitantes ou que está situado em regiões metropolitanas, aglomerações urbanas, em áreas de interesse turístico, ou sob influência de empreendimentos de grande impacto ambiental deve elaborar o Plano Diretor, como instrumento de desenvolvimento e expansão urbana (BRASIL, Estatuto da Cidade, 2001).

Plano Plurianual (PPA): é um instrumento previsto na Constituição Federal para organizar e apresentar o conjunto de projetos e programas governamentais e os meios para sua implementação para um período de quatro anos. Este documento deve ser elaborado por todos os níveis governamentais, municípios, estados e União, sempre no primeiro ano de governo, de tal forma que sua duração contemple os três anos seguintes de mandato e o primeiro ano do governo subsequente.

Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO): instrumento orientador da elaboração e execução do orçamento anual – municipal, estadual ou nacional – compreendendo as metas e prioridades da administração pública. Tal como os demais instrumentos mencionados, deve ser elaborado pelo poder executivo e está sujeito à aprovação pelo poder legislativo.

A partir de 1988, o Estado brasileiro reconheceu juridicamente o direito humano à educação de pessoas jovens e adultas (EJA), que passou a se constituir em uma modalidade específica da educação básica apoiada na defesa do direito de todos e todas à educação ao longo da vida e no reconhecimento de pessoas jovens e adultas como sujeitos de conhecimento e de aprendizagem.

Constituição Federal do Brasil de 1988

Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: I – educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria.

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de 1996

Art. 37 § 1.º Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e aos adultos, que não puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos e exames A ampliação das políticas públicas de EJA reflete a pressão de grupos sociais organizados em torno da democratização da educação no país e coloca a urgência de superar a baixa escolaridade como importante elemento da persistente desigualdade social brasileira. O princípio do direito à educação para todos e todas ao longo da vida trouxe como desafio à política educacional brasileira a proposição de processos educativos baseados nos saberes, nas bagagens culturais e nas necessidades básicas de aprendizagem desses sujeitos.

Revisão Participativa e outras propostas

A construção, o monitoramento e a avaliação participativa de Planos de Educação constituem oportunidade fundamental para que municípios e estados garantam o direito à educação de jovens e adultos.

Construir um bom diagnóstico sobre a situação da EJA no município ou estado, identificar a demanda social, levantar propostas junto às comunidades e aos sujeitos da EJA sobre como melhorar o atendimento os recursos financeiros disponíveis, constituem passos importantes.

A seguir, indicamos algumas outras propostas para fortalecer a EJA no Plano de Educação de seu município ou estado:

• Levantar a demanda por EJA (ex.: censo) no município ou estado.
• Realizar a chamada pública para a matrícula de forma que se obtenha um grande alcance, com divulgação nos meios de comunicação disponíveis.
• Promover estudos e pesquisas sobre o público demandante de EJA e as possíveis formas de seu atendimento.
• Buscar articulação com os fóruns e movimentos sociais dedicados à EJA.
• Levantar propostas junto a educandos, educadores e profissionais da EJA para a modalidade.
• Criar formas de articulação entre programas de alfabetização e estratégias de elevação de escolaridade, favorecendo a continuidade dos estudos na educação básica.
• Promover o registro e a divulgação de experiências realizadas.
• Envolver outras áreas dos governos na discussão de metas intersetoriais dos Planos de Educação, destinadas a fortalecer a EJA no município ou estado.