Em decorrência da pandemia do Coronavírus, entidades pedem ao STF suspensão imediata do Teto de Gastos

Organizações alegam que créditos extraordinários serão insuficientes para enfrentar a pandemia do Coronavírus e solicitam que haja um Plano de Ação Emergencial que inclua bolsa alimentação a estudantes sem merenda.

Presidente do STF, ministro Dias Toffoli, se reune com autoridades para tratar crise do coronavírus. Imagem retrata reunião de pessoas no Supremo Tribunal Federal.
Presidente do STF, ministro Dias Toffoli, se reune com autoridades para tratar crise do coronavírus. Créditos Fellipe Sampaio / SCO-STF

Entidades de direitos humanos protocolaram ontem à noite (17/3) no Supremo Federal Tribunal uma petição de suspensão imediata da Emenda Constitucional 95, conhecida como Teto dos Gastos. As entidades afirmam que a pandemia de Coronavírus pode levar o sistema de saúde e outras políticas sociais ao colapso e que os efeitos vão ultrapassar 2020. Alegam também que somente a complementação de recursos por meio de créditos extraordinários não conseguirá restabelecer a condição dos sistemas públicos de atender a população afetada.

“Os efeitos são de médio e longo prazo e os créditos extraordinários serão insuficientes para enfrentar tamanha fragilidade do sistema”, argumenta Eloisa Machado, advogada do grupo de entidades, vinculada ao Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos – CADHu.

Segundo as organizações, as políticas sociais vivem hoje um quadro de profunda deterioração com os cortes de financiamento, ao mesmo tempo em que a demanda por atendimento cresce com o aumento acelerado da pobreza e da extrema pobreza decorrente da crise econômica e da precarização das relações de trabalho.

“É nesse contexto explosivo de crescimento da miséria e de destruição das políticas sociais e dos direitos trabalhistas que o COVID-19 chega ao país. Apelamos ao STF para que dê um basta a uma Emenda Constitucional que viola frontalmente os direitos constitucionais da população e só faz crescer a fome, o sofrimento e a morte, favorecendo uma minoria”, destaca Denise Carreira, coordenadora da Plataforma DHESCA e da Ação Educativa, uma das entidades que entraram com a petição.

Plano de Ação Emergencial

Além da suspensão da Emenda, o documento destaca a importância de um plano de ação emergencial de enfrentamento da pandemia com ações de saúde, segurança alimentar, assistência social e educação. Uma das propostas é que o plano inclua a garantia de bolsa alimentação escolar nacional para estudantes que ficarão sem a merenda no período de interrupção das aulas.

A petição é assinada por Ação Educativa, Conectas Direitos Humanos, Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Cedeca-Ceará e Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento Educacional (Fineduca), e conta com amplo apoio de fóruns nacionais, redes de sociedade civil, movimentos sociais e instituições acadêmicas.

EC 95: a destruição de um país

Aprovada em dezembro de 2016, a Emenda Constitucional (EC) 95 estabeleceu a redução do gasto público em educação, saúde, assistência social e em outras políticas sociais por vinte anos. Em decorrência dos cortes, a Emenda tem aprofundado os indicadores de miséria e acentuado as desigualdades sociais do país e comprometido as condições de sobrevivência da população, sobretudo da população pobre e negra.

Pelos drásticos efeitos nas condições de vida da população, a EC 95 é objeto das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) 5633, 5643, 5655, 5658, 5715 e 5743 que solicitam sua revogação imediata pelo Supremo Tribunal Federal. Todas essas ADIs foram distribuídas à Ministra Rosa Weber.

Estudos da Plataforma DHESCA; do Inesc/Oxfam/Centro para os Direitos Econômicos e Sociais; e do IPEA, entre muitos outros, vêm demonstrando o profundo impacto da Emenda em várias áreas sociais, acarretando grandes retrocessos na garantia de direitos.

Em agosto de 2018, sete Relatores da ONU lançaram UM pronunciamento internacional conjunto denunciando os efeitos sociais da Emenda Constitucional 95 e o fato do Brasil ser o único país do mundo a ter constitucionalizado a austeridade como política econômica de longo prazo.

Ainda em 2018, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos realizou, depois de mais de duas décadas, uma visita ao Brasil para averiguar a situação dos direitos humanos. O relatório preliminar da CIDH manifestou grande preocupação com o fato de o país ter uma política fiscal que desconhece “o princípio de progressividade e não regressividade em matéria de direitos econômicos, sociais e ambientais”.

Criticada no país e internacionalmente como extremamente ineficaz e destruidora das condições de vida da população, inclusive por organismos internacionais conservadores como o próprio Fundo Monetário Internacional (FMI), a política econômica de austeridade tem como base o entendimento de que há somente um caminho para um país sair da crise econômica: cortar gastos sociais, atacar direitos constitucionais e privatizar bens públicos.

Esse caminho cria um círculo vicioso que desaquece a economia, aumenta o desemprego, diminui a arrecadação de impostos, concentra a renda ainda mais na mão de poucos, destrói setores produtivos da economia nacional e viola – de forma ampla e extremamente perversa – os direitos humanos da população, com impacto terrível nos setores mais pobres. Ao contrário: os investimentos sociais diminuem a desigualdade e são motor de desenvolvimento econômico com justiça social. Por isso, em vários países, mesmo em períodos de crise, há aumento desse investimento, considerada uma medida anticíclica.

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