Após o adiamento da Conferência Nacional de Educação (Conae) 2014, ficou em evidência a autonomia e as perspectivas de atuação do Fórum Nacional de Educação (FNE). Buscando compreender o contexto atual e as responsabilidades do Fórum, o portal De Olho nos Planos conversou com o coordenador da Comissão Especial de Sistematização e Monitoramento do FNE, pelo Ministério da Educação (MEC), Arlindo Cavalcante de Queiroz.
Entre outras questões relacionadas ao órgão, Arlindo classificou como fundamental que o “Fórum consagre sua independência, sua autonomia como órgão de Estado e que tenha rubrica própria não só para fazer o monitoramento das políticas públicas, no sentido de efetivar as deliberações da Conae, mas também para custear a própria realização da conferência”.
Leia abaixo a entrevista completa:
De Olho – Com o cancelamento da Conae, ficou em evidencia a autonomia e o carater deliberativo do Fórum Nacional de Educação (FNE). Como o senhor avalia a consolidação e a atuação do Fórum?
Arlindo Cavalcante de Queiroz – Ele foi criado por uma portaria ministerial, por meio de uma medida sub-legislativa, sequer por um decreto, mas, tem uma atuação expressiva e inédita no país. Atuando desde 2010, quando foi criado com base nas recomendações do Documento Final aprovado na Conae, o Fórum conseguiu acompanhar as deliberações da conferência, entre elas, a tramitação do Plano Nacional de Educação e organização da conferência nacional de 2014. É bom lembrar que a nova redação dada ao artigo 214 da CF, criando planos decenais de educação e atribuindo a eles o objetivo de articular o sistema nacional de educação, teve a influência desse processo participativo. O PNE anterior estava nas disposições transitórias da LDB que criou a década da educação e determinou a aprovação de um plano de educação para ela. Agora teremos sempre planos decenais e com uma proporção do PIB para execução de suas metas. Essa é uma conquista da Conae/FNE no rumo da construção do sistema nacional de educação.
Assim como o Sistema Nacional de Educação, o Fórum também está em construção e é uma de suas peças fundamentais por ser o lugar da mediação, da pactuação e dos acordos sobre as políticas públicas na perspectiva dos novos caminhos da educação nacional. É o lugar onde estão representadas todas as entidades nacionais da sociedade civil e dos governos federal, estaduais e municipais e onde se consegue construir uma política nacional de educação a partir do diálogo e da mediação realizados por meio de conferências de educação.
De Olho – E como o Fórum reagiu ao adiamento da Conferência Nacional de Educação (Conae)?
ACQ – O Fórum se sentiu impactado e perplexo com a notícia [do adiamento da Conae], analisou as razões colocadas e a única solução era marcar uma nova data. Na realidade, o fórum não adiou a conferência, mas concluiu que as circunstâncias tornavam o adiamento inevitável e irreversível.
De Olho – E o que seria necessário para fortalecer essa atuação do FNE? Aprová-lo como lei e não apenas a partir de um decreto?
ACQ – Uma medida legislativa tem mais força do que uma medida sub-legistativa, como um decreto ou a portaria que criou o Fórum. No entanto, muitas vezes, mesmo não estando coberta por uma lei, uma medida é poderosa porque altera a correlação de forças sociais. E esse é o caso do Fórum Nacional de Educação tanto pela representatividade das entidades nacionais que o constituem, quanto pela capilaridade e organicidade dessas entidades. No entanto, para que ele consiga se inscrever no ordenamento jurídico nacional é necessário que vá para além do Plano Nacional de Educação (PNE).
A lei do plano é uma lei decenal e o Fórum não é uma peça temporária, mas permanente. O FNE precisa constar na Constituição Federal e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional como parte da estrutura do Sistema Nacional de Educação. Mas para isso é preciso uma caminhada e é por isso que eu digo que o Fórum está em construção.
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De Olho – Quais as principais ações e responsabilidades do Fórum Nacional de Educação? E quais as perspectivas para sua atuação?
ACQ – Além de organizar a Conferência [Nacional de Educação], o Fórum cuida principalmente da efetividade de suas deliberações. Unindo uma e outra conferência, ele tem sido uma peça fundamental para garantir a mobilização e a realização de planos nacionais de educação, que possuem duração de dez anos e têm força constitucional. E essa é uma conquista que obtivemos a partir das conferências e do FNE.
A Conae e o FNE influenciaram, também, de alguma forma, em outras medidas tanto legislativas quanto administrativas, por exemplo: na política de cotas, na aprovação de parte dos recursos do pré-sal para a educação, na reestruturação do MEC com a criação da Secretaria de Articulação dos Sistemas de Ensino (Sase) e da Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior (Seres). Já o MEC, ficou responsável por viabilizar todo o apoio administrativo e financeiro ao Fórum, que ainda não possui uma rubrica orçamentária própria, sendo custeado pela própria secretaria executiva do ministério. Essa situação precisa se alterar para que o Fórum seja um órgão vinculado ao MEC, mas que seja autônomo – órgão de Estado – e que tenha orçamento próprio.
Tudo indica que estamos neste caminho, mas é claro que estamos em meio a uma correlação de forças e, portanto, é fundamental fortalecer aquelas forças que desejam que a Conae e o Fórum se consolidem. Não estamos na situação ideal, mas o MEC tem garantido que todas as atividades do Fórum possam ser realizadas. Os recursos foram sempre assegurados.
É fundamental que o Fórum nacional – e os fóruns estaduais, municipais e do Distrito Federal correspondentes – consagre sua independência, sua autonomia como órgão do Estado e que tenham rubricas próprias não só para fazer o monitoramento das políticas públicas, no sentido de efetivar as deliberações da Conae, mas também para custear a própria realização da conferência.
De Olho – E como o senhor avalia a composição do Fórum?
ACQ – Ele consegue dar conta da diversidade dos movimentos sociais, da sociedade civil e das instituições governamentais. É claro que o Fórum está permanentemente em aperfeiçoamento e, neste sentido, ele avalia sua composição a partir de demandas concretas do movimento da sociedade.
Por isso que em outubro, pelo regimento, o Fórum vai receber novas demandas e avaliar. Hoje, há representação do governo e da sociedade civil, do setor público e privado, de representantes de todos os níveis etapas e modalidades de ensino, com a presença de segmentos educacionais de pais, estudantes, conselheiros, gestores e profissionais da educação, por exemplo. Além disso, o Fórum tem representantes da comunidade científica e dos movimentos do campo, negro, da diversidade sexual e de gênero, da educação indígena, de organizações do direito à educação e de setores empresariais e dos trabalhadores.
Apesar de dar conta de todas estas expressões, o Fórum está sempre em aperfeiçoamento e atento às demandas da sociedade para realizar ajustes e ser representativo às forças sociais que estão postas no país.
De Olho – Como é realizada a eleição da coordenação do Fórum?
ACQ – Neste ano concluímos quatro anos de atuação e abrimos a discussão para a eleição de um novo coordenador. Pelo acordo estabelecido na eleição do primeiro coordenador, deve haver um revezamento, sendo eleito um coordenador da sociedade civil, de uma entidade com representação nacional.
*Entrevsta realizada com colaboração de Gustavo Paiva
**Foto: Arlindo Cavalcante de Queiroz – Crédito: Assessoria/Divulgação/MEC
Reportagem – Gabriel Maia Salgado
Edição – Ananda Grinkraut
Boa iniciativa a ferramenta em tela. Tomara que tenha fôlego para resistir as ações imediatistas e intempestivas dos governantes e da governança que historicamente ignoram os preceitos da administração pública e imprimem nela gestões motivadas por interesses particulares, como se fossem propriedades privadas. República para que?! O PDE projeto pessoal do Fernando Haddad e seus corpus políticos, em 2007, de forma semelhante aos feitos pelo Estado Novo varguista, Plano de Metas de JK e planos setoriais dos milicos, dentre outros, são bons exemplos de polícias que anularam a perspectiva de plano e de planejamento idealizados pelos Pioneiros da Educação Nova de 1932. A perspectiva de plano de longo prazo e de gestão democrática pelos programas do Dase e da Cafise (2004-2007),iniciada na gestão do ministro Tarso Genro, apesar dos poucos recursos que dispunha/recebia. Foi um projeto significativo que mobilizou diversos e diferentes cenários da educação do país. A perspectiva era a construção, avaliação e monitoramento de planos decenais (integrados e integrais), mediante diagnósticos, das discussões coletivas, das audições realizadas in loco ou por diversos canais, como entes e agentes da educação das diversas partes do país. Foi um trabalho planejado que buscou compreender a educação e o planejamento educacional de longo prazo – para os estados e municípios – à luz das diversas e complexas dimensões educacionais. Isso sucumbiu a partir do equívoco da decisão política orquestrada a partir de gabinete ministerial do então ministro Haddad que aniquilou a proposta mais acertada de implementação de PNE que se tem conhecimento na história. Na pesquisa apresentada como pré- requisito de conclusão de mestrado na UnB, disponível em: http://repositorio.unb.br/bitstream/10482/15315/1/2013_XavierCarvalhodeSousaNeto.pdf , discuto parte dessa problemática que em outras pesquisas e/ou análises do PNE, raramente, aparece.
Por fim , parabenizo o Arlindo e sua equipe, que à frente dos gestores do seu tempo, conseguem vislumbrar/encontrar/protagonizar iniciativas e perspectivas dessa natureza que são inspiradora da tão desejada e proclamada, porém nunca materializada, gestão democrática da educação.
Xavier Carvalho Sousa Neto
Técnico em Assuntos Educacionais do MEC