17 países pressionam o Brasil sobre a implementação do Plano Nacional de Educação

Durante revisão periódica sobre direitos humanos na ONU, os países também recomendaram mais investimentos em educação e a discussão de questões de gênero na escola

 

África do Sul, Coreia do Sul, Indonésia, Irã, Iraque, Israel, Japão, Líbia, Madagascar, Malásia, Marrocos, Nepal, Paraguai, Peru, Serra Leoa, Sudão e Timor Leste recomendaram ao Brasil que implemente o Plano Nacional de Educação (PNE) – Lei 13.005/2014, durante a Revisão Periódica Universal (RPU) ao Brasil, da Organização das Nações Unidas (ONU), ocorrida na última sexta-feira (dia 05/05).

A RPU é uma sabatina pela qual todos os Estados-membros da ONU devem passar para prestar contas aos outros países sobre suas ações e políticas direcionadas à garantia dos direitos humanos de seus(suas) cidadãos(ãs). Os outros Estados-membros, então, fazem recomendações ao país com base em três relatórios: um compilado das submissões da sociedade civil, um compilado das informações da própria ONU, e outro submetido pelo governo brasileiro.

O Japão parabenizou o Brasil pela aprovação do PNE, recomendou sua implementação plena e indicou que o Brasil continue a tomar medidas para a redução das desigualdades na educação, que são diretamente ligadas às desigualdades sociais e de renda. A Malásia recomendou a garantia de fundos para a implementação do PNE, e a China recomendou ao país o aumento do investimento em infraestrutura educacional, especialmente em áreas rurais. Já a Venezuela criticou diretamente a aprovação da Emenda Constitucional (EC) 95/2016, que impõe um teto de gastos aos investimentos em políticas sociais.

África do Sul, China, Haiti, Japão, Liechtenstein, Malásia, Nepal, Paraguai, Peru e Venezuela também abordaram a necessidade de mais investimentos para a educação, com críticas às políticas econômicas de austeridade, enquanto Finlândia, Haiti e Honduras falaram sobre incluir todas as crianças e os adolescentes na escola, e melhorar a qualidade da educação.

As questões de gênero e orientação sexual também foram abordadas pelos países. Em referência à retirada dos termos “orientação sexual” e “identidade de gênero” do documento final da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a Finlândia criticou essa decisão e o que ela significa para o combate a esses tipos de discriminação. “Sob a pressão de líderes religiosos, parlamentares de 12 dos 27 estados brasileiros retiraram dos planos de educação estratégias que buscavam superar as desigualdades de gênero, orientação sexual e raça”, cita o relatório compilado da sociedade civil.

Andressa Pellanda e Daniel Cara, da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, durante a 27a Sessão da Revisão Periódica Universal (RPU) da ONU, em Genebra (Suíça) (Créditos: Campanha/Divulgação)

 

Posicionamento do governo

Tanto o relatório das submissões das OSCs quanto o das Nações Unidas reiteram que o PNE representa uma importante conquista, sendo muito bem-vindo como instrumento para o cumprimento do direito humano à educação no Brasil. “É importante observar que as compilações da sociedade civil e da ONU são convergentes, trazem questões similares ou iguais e não fogem de desafios do Brasil. Contudo, o texto apresentado pelo governo é divergente, pois é vago em temas sensíveis, especialmente o financiamento adequado dos direitos sociais”, afirmou Daniel Cara, coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, que esteve presente em Genebra (Suíça) durante o evento.

O relatório da sociedade civil foi construído pela Campanha, em conjunto com a Ação Educativa, a Anced (Associação Nacional dos Centros de Defesa de Direitos de Crianças e Adolescentes) e a Clade (Campanha Latino Americana pelo Direito à Educação).

Maria Helena Guimarães de Castro, secretária executiva do Ministério da Educação (MEC) que fez parte da delegação brasileira chefiada pela ministra dos Direitos Humanos, Luislinda Valois, não comentou sobre a não implementação do Plano, mas defendeu a EC 95/2016, argumentando que a medida não apresenta um risco para a garantia da qualidade na educação no país.

“Quem faz contas, com o mínimo de cuidado, sabe: se é preciso construir escolas, melhorar a remuneração dos professores, adequar o número de alunos por turma, equipar prédios escolares e aumentar matrículas no ensino superior, é preciso mais recurso. Não há fenômeno demográfico capaz de mudar essa necessidade, como argumenta o governo. Tem muita gente fora da escola e a educação pública não respeita o padrão mínimo de qualidade”, comentou Daniel Cara.

A secretária-executiva do MEC, após processo de pressão internacional, também afirmou que o governo se posicionou contra o “Escola Sem Partido”, mas, em seu discurso sobre a BNCC, apesar de citar diversas formas de discriminação, não explicitou a por “orientação sexual”.

O processo de revisão acontece a cada quatro anos e meio, e essa é a terceira vez que o Brasil participa desde que a RPU foi criada pela ONU. Ao total, 103 países participaram da 27a Sessão ao Brasil. O país tem até setembro para definir quais recomendações e metas aceitará para o próximo ciclo de revisão.

“Foi uma vitória da sociedade civil. As compilações das contribuições da sociedade civil e das Nações Unidas foram bem incorporadas pelos países, especialmente no tocante ao direito à educação. O governo sai pressionado, pois apresentou um relatório alheio à realidade”, afirmou Daniel.

*Com informações da Campanha Nacional pelo Direito à Educação

 

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