Mesmo enfrentando adversidades, Campinas (SP) realizará Conferência para monitorar Plano de Educação

Apesar de repasse federal estrangulado e de ausência de um regime de colaboração, Campinas (SP) já elegeu delegados e fará sua Conferência Municipal de Educação no final do mês

Pré Conferência Municipal de Educação de Campinas - Região Nordeste - Wagner Souza/ Diuvlgação 

Imagem retrata grupo de 21 pessoas reunidas em sala de aula.
Pré Conferência Municipal de Educação de Campinas – Região Nordeste – Wagner Souza/ DIuvlgação

Começaram no penúltimo sábado (24) as Pré-Conferências Municipais de Educação de Campinas. Com a presença de professoras/es, estudantes, familiares, gestores/as, parlamentares e integrantes de movimentos sociais, as Pré-Conferências tiveram como objetivo avaliar a execução do Plano Municipal entre 2015 e 2017 e eleger delegados para  1ª Conferência Municipal de Educação, que será realizada ainda neste ano, no último sábado (28) do mês de setembro.

“É um momento muito importante para discutir todas as metas e verificar onde estão as maiores dificuldades”, relata Gustavo Petta, presidente da Comissão de Educação e Cultura da Câmara Municipal de Educação.

Em vigor desde 2015, o Plano Municipal de Educação de Campinas contempla 22 metas e 262 estratégias que devem ser cumpridas até 2025. Entre as metas previstas, estão a universalização da Educação Infantil para crianças de 4 a 5 anos; a universalização da alfabetização da população com mais de 15 anos; a revisão democrática do Plano de Carreira e do Estatuto do Magistério Público; a consolidação de políticas educacionais que garantam o ensino de história e cultura indígena, africana e afro-brasileira nas escolas; entre outras.

Participação Social

Como previsto no Plano, o monitoramento das metas deve ser conduzido pela Secretaria Municipal de Educação, o Conselho Municipal de Educação e o Fórum Permanente de Educação. A cada três anos, os resultados do monitoramento devem ser divulgados nos sites das entidades e debatidos em Conferências Municipais de Educação, para que se possa publicamente analisar o percentual de investimento público na área e propor políticas para assegurar a implementação das metas e estratégias estagnadas.

“É importante chamar a população e mostrar a importância de um Plano. Porque, às vezes, as pessoas pensam: ‘ah, não tem nada a ver comigo’. Mas tem, porque todo mundo está envolvido com a educação. Se não está na escola pública está na particular, se não está na Educação Infantil, está no Ensino Fundamental, no Médio, no Superior – envolve todo mundo. Por isso é importante que todo mundo conheça e se envolva com a Conferência”, pontua Solange, presidente do Fórum Municipal de Educação.

Também para Claudio Borges, professor da rede municipal e integrante do Conselho de Escolas Municipais de Campinas (CEMC), a participação é central no processo de monitoramento e avaliação das metas.

“[A participação] é importante para criar uma cultura política de não atribuir estritamente aos representantes que estão no Poder Público, seja no executivo ou no legislativo, a função de fazer diagnóstico das políticas. Diagnóstico, planejamento, avaliação e redirecionamento de financiamentos e ações da Secretaria deveriam ser um assunto mais público e mais debatido em âmbitos coletivos. Inclusive, seria um processo de aprendizagem para várias parcelas da população se apropriarem do que hoje está, cada vez mais, sendo colocado como uma questão de ordem técnica, e que então caberia só alguns especialistas a tarefa de fazer essa condução. Acho que a gente está em um movimento agora, nessa crise de democracia, de nos reapropriarmos desse papel mais protagonista da população”, assinala Claudio.

+ SAIBA TUDO SOBRE O MONITORAMENTO PARTICIPATIVO DOS PLANOS DE EDUCAÇÃO

Entraves

Apesar da mobilização em defesa do Plano, o município tem enfrentado alguns entraves para que todas as metas sejam cumpridas.

“Acho que o principal é a questão do financiamento. Nos planos estão previstas ações que dependem concretamente do aumento do financiamento. E a discussão de financiamento nacional não avançou, o que tem dificultado a implementação para os municípios. O financiamento está sendo reduzido ao invés de ser ampliado. Então este é um grande desafio”, avalia Luiz Roberto Marighetti, diretor do Departamento Pedagógico da Secretaria Municipal de Educação. “A definição do Custo Aluno-Qualidade (CAQ) também é um item. A gente tem estratégias no plano específicas e relativas a isso. Se isso não foi discutido no âmbito federal, a gente não consegue implantar algumas estratégias aqui”, completa.

Além do financiamento, Luiz também vê a ausência de um regime de colaboração consolidado como uma dificuldade para a implementação do plano. “O Plano versa sobre o município todo. Ele não trata de uma só rede. Quando faço um Plano para Campinas, estou tratando do Ensino Superior (público e privado), estou tratando da Educação Básica (pública e privada), e, no caso da Educação Básica pública, estou tratando ainda de três entes que oferecem a Educação Básica: a União, o estado e o município. Para a implementação do Plano e das ações nele previstas, é fundamental se ter o regime de colaboração construído. E isso também não avançou. Nem em âmbito federal, nem em estados e municípios”, lamenta.

Efeito cascata

Tanto para Claudio, quanto para Gustavo, o esvaziamento do Plano em âmbito nacional tem tido um efeito cascata sobre os municípios.

“Essa desconsideração a nível do Governo Federal, e não só isso, como a definição de uma outra agenda, acabou sendo incentivo para que os governos em âmbito municipal e estadual também abandonassem responsabilidades que estão previstas. Fora isso, acho que também tem uma falta de tradição da gente se orientar por Planos de Educação. Embora tenha havido no processo de elaboração do Plano um envolvimento significativo, não só de professores, mas de outros setores da população, depois disso, o processo de acompanhamento e monitoramento foi muito frágil”, comenta Claudio.

“Nós não observamos nenhum compromisso ou respeito ao Plano Nacional de Educação por parte do atual Governo e do Ministério da Educação. E isto cria dificuldades enormes para os municípios. Quando a gente fala em contingenciamento ou corte de verbas para o Ensino Superior, nós também reforçamos muito que há um contingenciamento ou corte para a Educação Infantil e Fundamental, o que impacta as metas do município”, avalia Gustavo. “Para além dos bloqueios de recursos dos convênios já feitos entre Governo Federal e Governo Municipal para a construção de novas creches, não há perspectiva nenhuma de novos convênios ou novas linhas de financiamento, o que traz muita dificuldade para as metas relacionadas à Educação Infantil”, exemplifica.

Pré-Conferência

Pré-Conferência Municipal de Educação de Campinas. Foto de convite mostra mapa de regiões em que haverá Pré-Conferências (Norte, Nordeste, Leste, Sudoeste e Sul). A imagem apresenta também a programação do evento:
08h às 9h30 Credenciamento
9h às 10h Mesa de Abertura
10h às 12h Grupos de Discussão
12 às 13h Almoço
13h às 15h Grupos de Discussão
15h às 17h Plenária Final
17h às 17h30 Eleição de Delegados para a Conferência

Para garantir que mais pessoas possam participar, a eleição de delegados/as para a Conferência foi realizada em 5 Pré-Conferências, organizadas por região: norte, leste, sul, sudoeste e noroeste. Cada uma das Pré-Conferências foi composta por sete grupos de trabalho, que ficaram responsáveis por debater entre 2 e 4 metas do plano.

Além dos grupos de trabalho, as Pré-Conferências contaram também com uma mesa de abertura e uma plenária final, onde os pontos levantados nos grupos foram apresentados a todos/as os/as presentes.

Período de avaliação

Um ponto de discordância entre as entidades diz respeito ao período de vigência do Plano sobre o qual a Conferência deve se debruçar.

Para a Secretaria, como a 1ª Conferência deveria originalmente ter ocorrido em 2018, cabe a ela se debruçar sobre a implementação do Plano no biênio anterior, ou seja, 2016 e 2017. O ano de 2018 e o início de 2019 deveriam, assim, ser avaliados em uma 2ª Conferência, a ser realizada em 2020.

“No nosso plano estão previstas 3 conferências de avaliação. A primeira conferência definia este primeiro biênio. E essa conferência de avaliação relativa ao biênio de 2016 e 2017 não foi feita. Então o que a gente está fazendo agora é a Conferência de avaliação deste primeiro biênio 16/17. No ano que vem, 2020, é que ocorreria a Conferência relativa ao biênio 18/19”, defende Luiz.

Para o Conselho de Escolas, entretanto, uma vez que a Conferência está sendo realizada em 2019, não há sentido em deixar de abordar o ano de 2018.

“Para os técnicos da Secretaria, como a gente não fez a Conferência de Avaliação (que deveria ter ocorrido no segundo ano), a gente está fazendo esta Conferência agora. Na prática isso não vai ocorrer, porque as pessoas vão forçar para que as questões que estão agora afligindo a população estejam sendo pautadas”, relata Claudio.

Outro argumento para que a Conferência abranja apenas 2016 e 2017 é a ausência de dados para o período subsequente. “A gente vai avaliar só 2016 e 2017, mas eu acho que vão aparecer pontos atuais que a gente não vai deixar de discutir. Mas a gente não tem os dados para esse levantamento”, pontua Solange, presidente do Fórum.

Para Claudio, entretanto, este argumento não se justifica, uma vez que já há dados federais relativos a 2018 e dados municipais do primeiro semestre de 2019. “Alegam que os dados que o MEC oferece não estão atualizados, então nas questões mensuráveis e quantitativas não haveria base de dados para poder fazer a apreciação. O que é equivocado, porque a gente tem o Censo Escolar do ano passado disponibilizado pelo MEC, e tem dados do sistema digital Secretaria relativos ao primeiro semestre de 2019. Então é uma opção política mesmo, de tentar fazer uma Conferência despolitizada”, avalia.

Perspectivas

A despeito do dissenso sobre o período de avaliação, a importância de defender o Plano e sua implementação é unânime. “Para a gente esse Plano é uma forma de resistência. Resistência a tudo que está acontecendo com a educação. Então a gente tem que lutar por esse Plano, tanto o municipal, quanto o estadual”, convoca Solange.

“A perspectiva acho que é a gente continuar perseguindo e persistindo na ideia de que o Plano Nacional e os respectivos Planos Municipais são planos de estado, do poder público, e não de governos. Eu acredito que nós precisamos continuar unidos: parlamentares ligados ao tema, gestores, professores, estudantes. É essa união em torno desses pactos que foram firmados e precisam ser respeitados que pode permitir reverter essa situação que nós estamos vivendo. A situação não é fácil, porque o Ministro da Educação de modo deliberado e enfático tem defendido a política de cortes de recursos na área de educação, mas eu acho que nós devemos persistir, porque é um tema muito importante para o desenvolvimento do país e a gente precisa lutar para superar”, defende Gustavo.

Confira mais fotos da Conferência:

Texto: Júlia Daher
Revisão: Claudia Bandeira

Saiba mais:

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